A Grã-Bretanha vive sob o regime monárquico há mais de 1.000 anos. E, embora a realeza já não possua mais do que um poder simbólico, as atribulações dos herdeiros contemporâneos e os noivados e casamentos reais continuam a atrair a atenção do público – não só dos britânicos, como em boa parte do mundo. Um exemplo disso é o burburinho em torno do casamento do príncipe William com Kate Middleton, sua noiva plebeia. A relevância da monarquia para a política britânica pode até ser colocada em discussão, mas a capacidade da realeza de promover festas e eventos memoráveis nunca esteve em dúvida.
Um dos motivos que explica a longevidade da monarquia britânica é justamente ter-se afastado das decisões políticas. Essa separação começou a ser moldada no século XIV, quando surgiram as duas Câmaras parlamentares, a dos comuns e a dos lordes. Mas o rei manteve a supremacia até 1689. Naquele ano, durante uma grave crise de sucessão, uma lei definiu o Parlamento como autoridade máxima. O poder político foi gradativamente transferido para as mãos do povo, sem que fosse preciso decapitar o monarca, como fizeram os franceses no século XVIII. Atualmente, o monarca chefia o estado e (sempre) aprova a indicação do primeiro-ministro feita pela Câmara dos Comuns. Desde o fim do século XIX ficou acertado que o monarca tem três direitos – “o direito de ser consultado, o direito de aconselhar e o direito de advertir”.
Ter uma família real de alta visibilidade e nenhum poder fora da esfera simbólica, um sistema parlamentar cheio de bizarrices e nenhuma constituição escrita são peculiaridades nacionais únicas da Grã-Bretanha. Ainda que respeitosamente dispensada de quaisquer afazeres administrativos, todos os anos a rainha abre os trabalhos do Parlamento com a coroa na cabeça, pronunciando um discurso escrito não por ela, mas pelo governo. Sem a política com que se ocupar, a realeza passou a se dedicar mais ao papel de referência social, principalmente a partir do celebrado reinado da rainha Vitória, o mais longo da história do país — de 1837 a 1901. No âmbito doméstico, Vitória se aproximou da população como modelo de conduta. Um modelo rígido, sem dúvida, mas com face humana.
No século XIX, o constitucionalista Walter Bagehot previu que o show da monarquia teria uma vida longa: “Quanto mais democráticos nos tornarmos, mais iremos apreciar a pompa e o espetáculo, que sempre agradaram ao vulgo”. Até aqui, a história o tem provado correto. Em setembro de 1969, 500 milhões de expectadores de todo o mundo assistiram à cerimônia em que
Charles ganhou o título de príncipe de Gales, concedido aos primogênitos dos reis britânicos – o príncipe, aliás, segue na ingrata tarefa de aguardar a morte da mãe para tornar-se rei. Em 1981, mais de 1 bilhão de pessoas assistiram ao suntuoso casamento de Charles e Diana. As comemorações do Jubileu de Ouro da rainha Elizabeth II, em 2002, contaram até mesmo com a presença do roqueiro Ozzy Osbourne. Também não faltou emoção – e audiência –no aniversário de 100 anos da rainha-mãe, Elizabeth I, em 2000, e no seu enterro,dois anos mais tarde.
Hoje, a realeza tem seu papel resumido a criadora de contos de fadas, nem sempre com finais felizes, visto os dramas do casamento entre o príncipe Charles e a princesa Diana. O conturbado fim do casamento e a morte trágica da princesa renovaram o interesse pelo trono, criando nos filhos de Diana novos modelos de comportamento. Tal interesse é reflexo de um dilema britânico. Ainda que considerem a monarquia arcaica, os ingleses não conseguem solucionar uma questão: o que fazer com ela.
A realeza está tão arraigada na estrutura política e social que eliminá-la da noite para o dia seria atentar contra a própria unidade nacional. Produzir assunto para a mesa de refeições e dividir as afeições dos súditos talvez não sejam justificativas suficientes para os 13 milhões de dólares gastos anualmente na Inglaterra somente com funcionários da corte e compromissos oficiais. Mas a existência de um monarca é vista por muitos como base da democracia do país.
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